Prazeres da culinária x Memória afetiva
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Por Ariane Ribeiro
De todas as memórias afetivas, com certeza, as melhores quase sempre têm a ver com comida. Tive a sensação de viajar pelo túnel do tempo ao participar de um passeio guiado, em Cássia dos Coqueiros, a 80 quilômetros de Ribeirão Preto. O intuito era conhecer o processo orgânico da produção de queijos feito na fazenda “Terra Límpida”. O passeio terminou com um delicioso almoço italiano, que serviu de entrada os mais de 10 tipos de queijos artesanais.
Durante o passeio, eu descobri o verdadeiro significado da frase “comida não é só para alimentar. Ela também aquece o coração”. Todo mundo tem um prato que remete a lembranças da comida da avó, mãe, pai, tio e tia. Sempre tem um alimento que nos leva para algum lugar gostoso da memória.
Memórias Afetivas
Eu guardo muitas. Nasci e cresci em uma cidade pequena, interior do interior de Ribeirão Preto, em Orlândia. O leite que eu bebia era entregue pelo leiteiro, numa carroça puxada por um cavalo e guiado por um senhor simpático, que além de encher a leiteira de dois litros, quantidade diária que minha mãe comprava, enchia também minha canequinha.
Os finais de semana eram na fazenda da família, em Aramina. O cheiro de mato, a plantação de milho, aquele ventinho que batia no rosto e dependendo da sensação térmica já era possível saber se ia chover, são lembranças muito presentes em mim.
Na fazenda com a caneca na mão eu participava da ordenha. Direto do peito da vaca o leite já saia quentinho e com aquela espuminha, que se misturava com o açúcar colocado no fundinho do copo. Depois de alguns anos, minha mãe virou uma eximia “fazedora” de queijo fresco, o melhor por sinal. Ela coloca o leite para ferver, prepara o coalho, peneira o soro, enforma os queijos, para depois deixá-los descansando, antes de desenformá-los.
A agricultura orgânica vem ganhando espaço ou retomando o que nunca deveria ter se perdido com a modernidade. A correria do dia a dia, os fast foods (todo mundo está sempre com pressa, quer tudo ‘pra ontem’, ninguém pode esperar) estão nos deixando mais distante das nossas essências, raízes.
Da Itália para Cássia dos Coqueiros
Ao chegar na fazenda me deparei com uma cooperativa de italianos que vive lá desde 2014. Eles se revezam entre os cuidados com o gado, horta, plantação de café e milho, além da produção de queijos.
Trazer o modelo de agricultura sustentável para o Brasil foi resultado de uma visita que os alunos da Universidade do Rio Grande do Norte fizeram à fazenda Poggio di Camporbiano, em San Gimignano, na Toscana. Os visitantes deram a ideia para os italianos virem conhecer o Brasil e aqui eles ficaram. Há cinco anos, os sócios da cooperativa se revezam em temporadas entre Brasil e Itália.
O sabor dos queijos é diferente de todos os outros que eu já havia comido, até hoje. Cada queijo que eu experimentava me lembrava do processo cuidadoso, limpo, sem nenhum agrotóxico que ele foi feito. Desde a alimentação da vaca, feita com sorvo e trigo, que também são plantados por eles, em um solo totalmente orgânico. A fazenda “dos italianos”, como são conhecidos por todos ali, abre a porteira para o turismo rural e recebe visitantes aos domingos para um típico almoço da toscana, com direito à degustação dos queijos e outras especialidades. “Só é preciso agendar com antecedência. Como tudo é preparado por nós, precisamos de dois dias para que os pães e pizzas de fermentação natural fiquem prontos”, explica Patrizia Alberti responsável, junto com seu marido, pelo projeto no Brasil.