Uso de máscara e a percepção distorcida da aparência
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Depois de dois anos de pandemia, as máscaras começam a sair de cena. No estado de São Paulo, o uso continua sendo obrigatório apenas em unidades de saúde e no transporte público. Com medo do surgimento de novas variantes, muitos mantêm o uso do acessório, principalmente em locais com grande concentração de pessoas. Mas há quem resiste a tirar a máscara por um motivo também preocupante: vergonha de expor o rosto por não aceitar a própria imagem ou por enxergar defeitos que não existem.
Nos consultórios, tem sido comum o relato de pacientes que admitem continuar usando máscara porque não gostam do nariz, da boca ou de alguma marca no rosto. O que inicialmente poderia ser confundido com excesso de vaidade pode, na verdade, esconder uma grave doença psiquiátrica.
O descontentamento exagerado com o corpo, ou uma parte dele, é uma das características dessa doença diagnosticada com bastante frequência nos consultórios de cirurgiões plásticos e dermatologistas: o transtorno dismórfico corporal (TDC) ou dismorfia corporal. O indivíduo tem preocupações decorrentes de defeitos mínimos ou inexistentes na aparência. Pacientes com TDC têm medo de terem seus “defeitos” notados, sentem vergonha e desconforto ao se exporem fisicamente, têm pensamentos de desilusão e em alguns casos desenvolvem rituais compulsivos, como busca constante por tratamentos cosméticos e até intervenções cirúrgicas na tentativa de resolver o problema. Por isto muitos casos são diagnosticados na consulta ao cirurgião plástico. Eles buscam na cirurgia plástica e nos procedimentos estéticos a solução para imperfeições que muitas vezes não existem. Quando o cirurgião plástico se depara com situações como esta, o paciente recebe toda uma orientação que pode incluir indicação de tratamento com psicólogos ou psiquiatras.
Os indivíduos com TDC apresentam alguns traços de compulsão. Dão importância exagerada a pequenos defeitos que são imperceptíveis para outras pessoas. O culto exagerado à beleza e a idealização de padrões, bastante comum nas redes sociais atualmente, podem contribuir com o desenvolvimento e manutenção da doença, comum principalmente na infância e na adolescência.
Prevenir o distúrbio TDC não é fácil porque são múltiplas as causas, mas quanto mais cedo for detectado, melhor para o paciente.
O fim do uso obrigatório de máscara acende um sinal de alerta e instiga uma reflexão sobre a nossa relação com o espelho. Se o uso da máscara cumpre mais o papel de esconder o rosto do que proteger contra a Covid, atenção. Preocupação exagerada com a imagem e percepções distorcidas da aparência que levam o indivíduo a se esconder em roupas largas, uso de acessórios e maquiagem em excesso, por exemplo, são indícios de que algo não vai bem.
Samir Eberlin é cirurgião plástico, membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) e especialista em cirurgia plástica pela Associação Médica Brasileira